Em
Psicanálise, narcisismo representa um modo particular de relação com a
sexualidade. Luciano Elia (1995) define o narcisismo como o processo pelo qual
o sujeito assume a imagem do seu corpo próprio como sua, e se identifica com
ela (eu sou essa imagem).
O Narcisismo não leva apenas à patologia, ele também é um protetor positivo do
psiquismo. Um narcisismo “que promove a constituição de uma imagem de si
unificada, perfeita, cumprida e inteira”. (Houser, 2006, pág. 33). Ultrapassa o
auto-erotismo para fornecer a integração de uma figura positiva e diferenciada
do outro.
Freud distingue dois tipos de narcisismo:narcisismo
primário; e narcisismo
secundário.
Narcisismo
primário
O primeiro modo de satisfação da libido seria o auto-erotismo conceituado como o prazer que o órgão retira de
si mesmo; essas pulsões, de forma independente, procuram cada qual por si, sua
satisfação no próprio corpo. Nesse período, ainda não existe uma unidade
comparável ao eu, nem uma real diferenciação do mundo.
Em seu texto de 1914 sobre o Narcisismo, Freud destaca a posição dos pais na
constituição do narcisismo primário dos filhos. Freud fala que o amor dos pais aos filhos é o
narcisismo dos pais renascido e transformado em amor objetal. O Narcisismo
primário representaria de certa forma, uma espécie de onipotência que se cria
no encontro entre o narcisismo nascente do bebê e o narcisismo renascente dos
pais.
Narcisismo
secundário
No caso do narcisismo
secundário há dois momentos: primeiro o investimento nos objetos; e
depois esse investimento reforma para o seu (ego). Quando o bebê já é capaz de
diferenciar seu próprio corpo do mundo externo, ele identifica suas
necessidades e quem ou o que as satisfaz; o sujeito concentra em um objeto suas
pulsões sexuais parciais, há um investimento objetal, que em geral se dirige
para a mãe e o seio como objeto parcial.
Com o tempo,
a criança vai percebendo que ela não é o único desejo da mãe, que ela não é
tudo para ela; “sua majestade, o bebê começa a ser destronado. Essa é a ferida
infligida no narcisismo primário da criança. A partir daí, o objetivo
consistirá em fazer-se amar pelo outro, em agradá-lo para reconquistar o seu
amor; mas isso só pode ser feito através da satisfação de certas exigências; a
do ideal do seu eu.” (Nazio, 1988, pág. 59)
O ideal de
ego
O ego ideal é ao mesmo tempo substituto do narcisismo
perdido da infância (onipotência infantil) e o produto da identificação das
figuras parentais, assim como seus intermediários sociais.
Freud (1914)
diz que o narcisismo do indivíduo surge deslocado em direção a esse ego ideal,
que como o ego infantil, se acha possuidor de toda perfeição e valor. O
indivíduo não está disposto a renunciar à perfeição narcísica de sua infância.
O que o indivíduo projeta diante de si como sendo seu ideal é o substituto do narcisismo
perdido da infância na qual ele era seu próprio ideal.
A formação de
um ideal aumenta as exigências do ego, constituindo o que Freud chama de o
fator mais poderoso a favor do recalque.
O eu (ego)
aspira reencontrar a perfeição e o amor narcísico, mas para isso precisa
satisfazer as exigências do ideal do eu (ego). A partir daí, só é possível
experimentar-se através do outro.
Escolha
objetal Narcísica
A escolha
objetal narcísica é segundo Freud, amar a si mesmo através de semelhante; e
todo amor objetal comporta uma parcela de narcisismo. O eu representa um
reflexo do objeto.
O ideal
sexual tem uma relação auxiliar com o ideal de ego. Pode ser empregada para
satisfação substituta, onde a satisfação narcisista encontra reais entraves. A
pessoa amará segundo o tipo narcisista de escolha objetal. (Freud, 1914)
Mas é
importante sublinhar que essa imagem amada é sexualmente investida. No
homossexualismo é uma imagem que representa o que a mãe deseja e ao amar essa
imagem, o homossexualismo como objeto. (Garcia-Roza, 2005)
O narcisismo
secundário é o investimento libidinal da imagem do eu, e essa imagem é
constituída pelas identificações do eu com as imagens dos objetos.
O Narcisismo
e a Teoria do Eu (Ego)
Antes da
introdução do conceito de narcisismo em 1914, o eu(ego) era compreendido como
massa ideacional consciente cujo principal objetivo é conservar a vida e reunir
o conjunto de forças que, no psiquismo, se opõe a sexualidade. O eu(ego) é
responsável pelo processo de recalcamento do representante ideativo do impulso
sexual, e constitui-se como a sede das pulsões de auto-conservação. Era o pólo
defensivo do aparelho psíquico, interessado em conservar a vida. (Elia,1995)
Essa teoria
tem uma forte matriz biológica, já que tem como objetivos conservar vivo e
conservar viva a espécie. Mas desde os Três Ensaios sobre a Sexualidade, Freud
(1905) já havia esclarecido que a pulsão não tem objeto adequado e no inicio da
vida predominam pulsões parciais.
Mas antes do
conceito de narcisismo, Freud não havia elaborado uma teoria de eu psicanaliticamente
consistente e rigorosamente pulsional.
O eu(ego)ate então do ponto de vista teórico
poderia ser definido como resumo do esforço de viver, trincheira de um desejo,
“o desejo de viver e manter-se vivo, campo natural da vida ,
conexo, porem oposto ao sexual, este perverso polimorfo, subversivo, voltado
para o gozo e o prazer mais do que para a vida”.(Elia,1995,pag117)
Introduzir o
narcisismo na teoria das pulsões, acarreta uma nova maneira de conceber o eu
(ego) e o dualismo pulsional. Nesta teoria, o eu forma outra dimensão, toma o
status de lugar de investimento pulsional.
Funcionamento
Narcisista: Características Clínicas
O narcisismo
não constitui por si só uma patologia, ele é um integrador e protetor da
personalidade e do psiquismo.
Lewknowicz
(2005) fala-nos que estamos vivendo em uma cultura com características
crescentemente narcisistas; onde há um predomínio do uso da imagem de ação
em vez da reflexão para lidar com a ansiedade e um incentivo exagerado ao
consumismo e ao culto ao corpo.
Nos pacientes
de funcionamento narcisista há uma exagerada preocupação com a aparência;
pequenos defeitos físicos são intensamente valorizados. Apresentam uma
necessidade exagerada de serem amados e admirados, buscam elogios e se sentem
inferiores e infelizes quando criticados ou ignorados.
Tem pouca
capacidade para perceber os outros, levando a vida emocional superficial. Há
inclusive uma forte dificuldade de formar uma verdadeira relação terapêutica.
Como o Mito
do Narciso, o paciente com esse tipo de funcionamento constrói sua sensação de
engrandecimento da auto-estima através de uma intensa desvalorização, rejeição
e abandono dos objetos. E sobre a base dessa rejeição que o organismo se
estrutura. (Lewkowicz, 2005).
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